Neuromanagement, por Flávio Maneira

A neurociência avança de tal forma que não pode ser mais ignorada sua relevância e aplicabilidade em diversos campos, seu caminho é um caminho sem volta, e com o principal: resultados surpreendentes.

“O neuromanagement é um campo interdisciplinar emergente, que utiliza técnicas de neuroimageamento para identificar substratos neurais associados a decisões e comportamentos no ambiente organizacional ” – Flávio Maneira.

Nesse artigo, ou melhor, nesse nosso “bate papo” iremos falar especificamente da aplicação de alguns pontos dentro do “universo” da neurociência e sua profunda ajuda na melhoria contínua do processo de “gestão”, seja para você que atua em alguma empresa, para você que é empreendedor ou almeja empreender no futuro ou até mesmo para você, que não pertence a nenhum desses grupos (ainda) e é apenas um curioso do tema, sem dúvida irá se beneficiar desta leitura.

Para isso, eu dividi esse nosso papo em 3 partes, na primeira parte falaremos um pouco sobre a “neurociência” de forma a elucidar melhor o por quê ela vive a “era de ouro”, bem como um olhar para o futuro promissor atrelado à tecnologia e à própria transformação em que o mundo vive, na qual o mantra é “adapte-se ou adapte-se”. Klaus Schwab, menciona a seguinte frase em seu indispensável livro: “A quarta revolução industrial” para quem quer entender esse novo contexto que estamos inseridos: Estamos a bordo de uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala, alcance e complexidade, a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano tenha experimentado antes”. Na segunda parte falaremos sobre “gestão”, afinal, o que entendemos por “gestão”? O que mudou na gestão? Qual o futuro da “gestão”? E por fim, na terceira parte, falaremos da semiose considerando o tema: “neurogestão”, ou seja, o significado da junção dessas duas grandes coisas: neurociência + gestão e sua vasta aplicação.

Parte 1: Você é seu cérebro, portanto não é desejável conhecê-lo, é fundamental. Essa é uma das afirmações mais assertivas quando o assunto é ser-humano, nós, nossa espécie. A ciência que se dedica a estudar ele, é a neurociência, ou seja, estuda o funcionamento cerebral. 

Até muito pouco tempo atrás, eram desconhecidos os mecanismos “neurais” que envolvem a compreensão e entendimento dos nossos comportamentos, do nosso aprendizado, da nossa memória, das nossas emoções, das nossas sensações, pensamentos, etc. Com o advento do grande avanço da tecnologia de imageamento cerebral (ressonância magnética funcional), entre outros avanços tecnológicos, como a biologia molecular, eletrofisiologia de múltiplos canais e por ai vai, tornou-se possível investigar mais a fundo cérebros vivos, sejam de forma indireta, como cobaias em laboratório, ou direta em pessoas que se tornam voluntários dispostos a se submeter a diversos tipos de testes que envolvem situações específicas (como observação de imagens) ou jogos específicos, com o objetivo de ver o “percurso” gerado por esses “estímulos” bem como o resultado deles. Nosso “cérebro” é um sistema altamente complexo e sensorial, que recebe informações do “meio” ao tempo todo, processa essas informações (grande parte de forma inconsciente) e reage a elas.

Questões relacionadas a neuroanatomia, que antes eram restritas a um grupo muito restrito e específico de cientistas e médicos, se popularizaram, como por exemplo: o papel do córtex pré-frontal que é o controle das funções executivas, o papel da amígdala na aquisição de “experiências”, bem como o sistema límbico no papel das emoções, hoje fazem parte de cursos on line, de revistas específicas com uma linguagem acessível e de artigos, como este. Quem ganha? Todos nós.

Além de questões envolvendo a neuroanatomia e seu respectivo funcionamento, nunca foi tão estudado e falado sobre alguns “neurotransmissores”, que se tornaram “celebridades” e ficaram mais conhecidos após uma revolução nos fármacos (medicamentos) e da interface com a sociedade, que avançaram significativamente nessa área, tais como os famosos “inibidores de receptação da serotonina”, “agonistas dopaminérgicos”, receptores dopaminérgicos e da ocitocina, entre outros. As pessoas queriam (e querem) entender melhor o papel desses neurotransmissores. 

Queremos, através da neurociência, entender como: pensamos, sentimos e agimos (comportamentos). Queremos desvendar a consciência e inconsciência, queremos entender melhor as emoções e o por quê ela é o que temos de melhor e pior, ou seja, termos uma melhor “gestão emocional” fará (e na minha opinião sempre fez) a diferença seja na sua vida pessoal, seja na sua vida profissional. Se interessar e estudar você, sob a perspectiva de que você é seu cérebro, de que é inteligente e assertivo, pois embora cérebros sejam iguais considerando sua fisiologia, são únicos, por uma simples razão: nossa experiência, ela é única, ela é sua, ela é minha.

Posso afirmar que é uma viagem divertida e fascinante e que quanto mais você entende seu cérebro mais você entende você e com isso, você consegue “gerenciar” melhor as consequências das suas escolhas para ter o que todos queremos: um cérebro saudável e performático, não é mesmo?

Parte 2:  Desde sempre fazemos “negócios”, mesmo nas primeiras civilizações, as pessoas pensam em negócios. Os antigos egípcios, maias, gregos, romanos, sabiam que a criação de riqueza através do comércio era fundamental para a obtenção de “poder”, além de garantir a base sobre a qual a civilização poderia prosperar. 

Segundo Edward D. Jones, um banqueiro norte-americano (1893-1982): “A arte da administração é tão velha quanto a raça humana” e enquanto povoarmos esse planeta teremos que “administrar” bem ele, acrescento: e nós mesmos e tudo a nossa volta, não é mesmo?

Os termos “gerente” e “gerenciamento”, são relativamente recentes considerando nossa história, eles surgiram no final do século XVI, palavras essas intimamente relacionadas a sua grande mãe: a “gestão” – ação de gerir, de administrar, de governar ou de dirigir negócios públicos ou particulares.

A “gestão” ganhou evidência e relevância (movida pela revolução industrial da época, onde o capital humano entra no jogo) em 1970 quando o Dr. Alfred Chandler avançou na área da administração enfatizando a “capacitação organizacional” e o “aprendizado contínuo” em seu curso da Havard business School. Com isso, grandes pesquisadores, teóricos e estudiosos do campo avançaram ainda mais a partir de 1980 e 1990, sendo referências até os dias de hoje em vários modelos de gestão que são extremamente eficientes, entre eles: Michael Porter, Igor Ansoff, Rosabeth Moss Kanter, Henrry Mintzberg e o emblemático e na minha opinião, o grande pai da gestão: Peter Druker. Esses foram os encorajadores de fazer com que as empresas/organizações estudassem profundamente o ambiente em que se inseriam, bem como as necessidades das pessoas (consumidor), permanecendo sempre abertas a mudança. 

No ano de 2000, impactado pela era da internet, avanço da comunicação e mercados globalizados e possibilidades jamais imaginadas em termos de negócios, surgem as famosas empresas de garagem e revolucionam a forma de fazer negócio, era o momento de ser ágil e aprender rápido, afinal o e-commerce e as milhares de “.com” e inicia um boom de empreendedores o que é super saudável para a economia de um país. A partir daí, ano a ano, a velocidade das coisas foi exponencial e com isso vieram oportunidades no qual bastava um lap top e uma boa ideia para fazer acontecer e monetizar algo. Nisso vem as redes sociais, a mobilidade (smartphones) e uma revolução no qual é praticamente impossível gerir um negócio sem ser de forma “hibridizada” – mundo real e mundo virtual.

Você até pode pensar em qualquer negócio e não estar presente na mídia social, como uma resistência ou até mesmo uma estratégia, porém, uma coisa não está na sua esfera de controle: alguém falar de você, não para 1, ou 2, 10 pessoas sobre seu produto e/ou serviço, mas sim para milhões em apenas uma postagem. Isso mudou o jogo. 

Entra nesse momento um novo “player”: o indivíduo conectado a tudo e a todos que não precisa de permissão para postar o que quiser, com isso, perde-se o controle e as empresas entendem que o jogo mudou e quem manda são dois novos protagonistas: o cliente e seu colaborador (funcionário), eles decidem.

Sempre digo de forma bem simples que “gestão” é ter claro seu “plano de negócios” (marketing/vendas, canais, relacionamento com os clientes, atividade-chave, proposta de valor, estrutura financeira) e muita clareza e controle em três aspectos: “gestão de produtos/serviços”, “gestão de processos” e “gestão de pessoas”, sim, todos dão muito trabalho, mas advinha em qual gestão é o principal desafio? Sim, isso mesmo, na “gente”.

Por fim, se você não tem clareza do que é exatamente e o que significa isso, provavelmente a “gestão” da sua empresa/negócio/organização pode ser impactada: BSC (Balance Score Card), Canvas Business Model Generation, Kaizen, SixSigma, Lean, Project Canvas, Design Thinking, Scrum, PDCA, IA (inteligência artificial), VR (realidade virtual), Gamification, e por aí vai… 

Não temos mais espaço em gestão para escolhas, por exemplo de se manter no modo “analógico” (não querer ser “digital”), o “ser digital” passa a ser mandatório para fazer negócio, fazer vídeos, criar conteúdo e desaprender para reaprender. Quem aprender melhor e mais rápido terá uma grande vantagem competitiva.

Portanto se você ainda pensa se “tem que” ter “Insta”, criar um podcast ou criar conteúdo relevante no seu linkedin e compartilhar, atualizar seu site (e por favor, deixá-lo responsivo), vários já estão na sua frente, portanto minha sugestão: corre lá e bem-vindo à “transformação digital”, fundamental para gerir qualquer negócio.

Parte 3: Que venha a neurociência e me ajude na “gestão” do meu negócio, e aí emerge e surge a “neurogestão”. Para gerir bem um negócio precisamos de competências específicas que são exigidas pela própria natureza do negócio, portanto se eu, através do conhecimento provido pela neurociência, posso dar potência a essas competências de forma a “performar” melhor, minha pergunta é: Por que não? 

Para a gestão de um negócio, algumas “competências” são essenciais e nos próximos anos, segundo o Fórum Econômico Mundial, avançam vários pontos à frente de outras, entre elas estão:

  • Comunicação;
  • Capacidade de solução de problemas complexos;
  • Criatividade;
  • Habilidade em vendas/negociação;
  • Gestão emocional;
  • Pensamento Sistêmico;
  • Aprendizagem;
  • Colaboração;
  • Alfabetização de novas tecnologias (be digital);

E onde entra a neurociência? Em tudo. Através de conhecimentos específicos e treinamentos específicos com metodologias considerando a neurociência, o resultado do incremento dessas competências quando comparados aos métodos tradicionais, são incomparáveis.

São considerados, desde ambientes (que são fundamentais para o processo de aprendizagem), área também conhecida como “neuroarquitetura”, até a escolha de um determinado alimento no “coffee break” que pode aumentar a concentração de “acetilcolina” (neurotransmissor que atua no aprendizado, entre outras funções), bem como a própria “metodologia” do treinamento em si, onde são analisados vários fatores para tornar mais “eficiente”, tudo sob a ótica da neurociência.

“People learning by doing” – pessoas aprendem fazendo, o “erro” também é fundamental para o processo de aprendizagem e o aperfeiçoamento só vem com a “repetição”, ambas estratégias adotadas quando utilizamos a “neurogestão”.

Concluo com um “bonus” para você que esteve comigo nesse papo até aqui, de algumas informações importantes sobre o funcionamento do nosso cérebro e desejo que faça um ótimo proveito delas e até a próxima! 

  • O cérebro não realiza muitas atividades ao mesmo tempo
  • A Informação é estocada em diversas áreas 
  • A aprendizagem é modulada quimicamente 
  • O significado é inato do ser humano 
  • Nossas emoções são críticas para padronização e memória
  • Aprender envolve também foco e percepção periférico.
  • O cérebro é social, aprende melhor com outros cérebros
  • O aprendizado complexo é ativado pelo desafio e inibido pelo estresse agudo.

Flávio Maneira, é membro da equipe Meu Cérebro, Executivo do setor da saúde há +20 anos, atuando desde 2015 na Medtronic Brasil, responsável pela Commercial Capabilities na América Latina, professor da Pós em Neurociência da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de SP além de mentor do My Brain University. Palestrante de assuntos ligados à gente”, “performance”, “neurociência” e “futuro”. 

Referências:

  • MACHADO, Angelo B.M.; HAERTEL, Lúcia Machado. Neuroanatomia funcional. 3.ed. São Paulo: Atheneu, 2006.
  • Mittal, R., Debs, L. H., Patel, A. P., Nguyen, D., Patel, K., O’Connor, G., Grati, M., Mittal, J., Yan, D., Eshraghi, A. A., Deo, S. K., Daunert, S., … Liu, X. Z. (2017). Neurotransmitters: The Critical Modulators Regulating Gut-Brain Axis. Journal of cellular physiology, 232(9), 2359-2372.
  • The Scientifc American, 24h in the life of your brain, 1.ed, 2009, John Wiley, Scientifc American
  • CHARNESS N., FELTOVICH, P.J., HOFMAN, R.R.,ERICKSON,K.A. The cambridge handbook of expertise and expert performance. Cambridge University Press, 2006.
  • SIEGLER,R.S.,STERN,E. Conscious and Unconscious strategy discoveries. Journal of Experimental Psychology 127(4), 1998, págs 277-397.
  • SPRENGER, M. Memória, como ensinar para o aluno lembrar. Artmed, 2008.
  • O livro dos negócios, 1. ed. São Paulo, Globo Livros, 2014.

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